O que posso dizer hoje sobre a minha mãe?!
Eu era a sua única filha, não éramos muito próximas,
entre nós sempre houveram grandes conflitos de personalidade. Ela era uma
mulher lindíssima, mas o que tinha de rara beleza, também o tinha em dose
excessiva de austeridade militarista. Não era de sorriso fácil, nem oferecia grandes manifestações
de amor e carinho. Mas no que tocava a formação e educação era rígida e não
deixava por mão alheia aquilo que só a ela lhe competia. Ensinou-me o significado da liberdade e da consequente maior responsabilidade, assim como me empurrou para a aprendizagem
compulsiva de que a vida tem que ser conquistada a pulso de trabalho e muita dedicação. Os meus pais sempre foram pessoas de posses, mas o supérfluo nunca
me foi dado de mão beijada. Se o queria, tinha que o conquistar, deitando mão
ao trabalho para o conseguir adquirir. Naquela altura, aquela postura de dureza
crua feria-me profundamente. Recusava-me a concebê-la no meu entendimento. No
entanto, hoje, só tenho que lhe agradecer tal rigidez de conduta. Formei-me, construí-me
e constituí família à custa de muito trabalho, de muito esforço e de muita dedicação.
Não devo nada a ninguém é um facto, mas sou de igual forma uma mulher de
sorriso pouco fácil, herança antiga do matriarcado. Nem tudo nesta vida que dá fruto, se faz
brotar rosa sem espinhos.
No tempo, herdei este legado de raiz sólida, que faço hoje por transmitir às minhas duas filhas, com alguns ajustamentos, obviamente; menos dose
de austeridade, e mais algum do meu sorriso espontâneo ;)
Acho que é esse o papel de mãe, ensinar os filhos a trabalhar
e a fertilizar a terra com vista a colher bons frutos. Eles nascem de nós, mas não
são nossos, pertencem ao mundo.