Sandra Louçano
Restaurante
D. Tonho, Porto
A
eternidade da espera, para estarmos juntos uma noite inteira, foi tão severa que
sem mais delongas, despidos de todos os formalismos, entramos no primeiro recanto
escondido que encontramos para jantar.
O
restaurante de gastronomia típica regional oferecia uma decoração rústica e
aconchegante, mesmo ao nosso gosto.
O teu
bife de lombo ao molho de manga com batata a murro enrolada em prata, a minha
espetada de lulas e gambas ao alho, e mais uns quantos vegetais salteados,
foram entremeados entre vinho, palavras, olhares e sorrisos tímidos, como se
fossemos dois perfeitos estranhos durante a primeira descoberta. A sala cheia
acolhia os amantes num murmurinho de conversas mudas e ouvidos cegos aos olhos
alheios.
Do
lado de fora, a noite de Porto à sexta é palco eufórico onde os corpos
extravasam de mais uma semana louca do trabalho. Prolongamos o prazer da
conversa e saímos tarde. Não estava frio, mas para os lados da Ribeira o
nevoeiro denso era quase certo;
- Um
café?
- Sim,
à beira rio, disse eu!
No
Porto a neblina, do outro lado levanta-se o véu sobre o rio de mão dada com a
maré.
Tomaste de imediato o café, gostas dele bem quente. Eu saboreei-o primeiro ao leve
encosto de lábios e deixei-o arrefecer lentamente enquanto o bebericava de
olhos postos na imagem do velho casario de granito, casado com o rio e de braço estendedido até ao mar.
A
viagem de regresso não permitiu visualizar a amplitude daquela paisagem, mas a
cegueira do momento guardou a contemplação de uma noite sonhada, enquanto a
música de fundo trauteava alegria entre olhares que estenderam cumplicidades até
de manhã.
Apesar do nevoeiro e do espelho negro, tudo à nossa volta estava muito claro aquela hora.
Apesar do nevoeiro e do espelho negro, tudo à nossa volta estava muito claro aquela hora.