sábado, 28 de setembro de 2013

A palavra está cara!

Título: Something about Jeanne Dark
Fotógrafo: Olena Chernenko
Colecção: Vetta


A palavra está cara!
Para quê gasta-la
com tanta fala,
que fala, fala, fala
e não diz nada!
Porquê então desperdiça-la?
Senhores, poupem a vossa lábia,

que a palavra está muito cara!

Meus senhores,
para quê manipula-la
comigo ou contigo?
Para quê entrega-la
de bandeja ao inimigo?
Mal usada
pode ser de grande perigo!
Meus senhores,
matem-se,
mas de graça.
E não se esqueçam,
a palavra está muito cara!


E por conta disto e mais daquilo,
a cada dia mais me viro
para a conversa do umbigo.
E por hoje meu querido, mais não digo,
a palavra está muito cara!

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Há dias























Título: Nude Woman Bending With Flamingo
Fotógrafo: Yuri Dojc
Colecção: The Image Bank

Há dias
que não reconheço

como minha
a pele que visto

no dia-a-dia.
Hoje,
é um desses dias!
Mas que raio,
porque acordei do lado,
no tempo
e no corpo errado?

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Gaiola

Titulo: Litle Cage
Fotógrafo: Irene Miravete
Colecção: Flickr

Tem dias que apetece rasgar
o silêncio

que cala a voz do coração e da alma.
Tem dias que essas palavras mudas
não consentem o que sentem.
Sufocam,
matando lentamente
em dolorosas prestações.
Hoje, não sei se foi um acto de coragem,
ou a causa perdida de um ataque de euforia,
só sei que vomitei a esgana,
baixei a guarda,
lavei a alma

e banhei-te nas lágrimas do meu amor.
Sei que quebrei,
que fiquei de alma exposta,
mas não faz mal, não importa,
já tenho a mala pronta e posta à porta.
O peito apertava em demasia,
para calar o que só a mim devia.
E não te ofereço,

nem te dou o que já te pertence,
o meu amor de adolescente.
Ao de leve como uma pena

deixo a minha gaiola em cima do teu piano,
e saio de cena de assobio ao lado,
trauteando alegremente o Fado do Disco Riscado.
Desculpa meu querido se te deixo este fardo,
mas se te for muito pesado,

joga fora a chave da portinhola.

sábado, 21 de setembro de 2013

Maria Ruiva a Peça de Teatro


Título: Autumn Walk
Fotógrafo: Olena Chernenko
Colecção: Vetta

Todos os dias, à mesma hora o portão do casarão abre, e eis que surge um traço de miúda que se afigura na paisagem como uma miragem, uma febre de fenos, um delírio de verão.
De lá vem descalça Maria Ruiva, a menina das sardas endiabradas, bamboleando-se lentamente até à fonte, deixando atrás de si um rasto de perfume de flores de jasmim, paralisando o tempo que a vê passar.
De costas voltadas à plateia, ignora a cobiça dos olhos alheios e debruça-se sobre a fonte. Nas mãos leva a frescura da água à boca, ao rosto e ao pescoço que lhe desce a fio pelo fio do corpo. Ergue-se num movimento de camara lenta, endireita-se como quem sacode a poeira e com os dedos ainda molhados penteia para trás os seus longos cabelos vermelhos.
A passarada faz coro em melodia e o cenário fica perfeito quando a brisa atrevida trepa aquela rebeldia vestido acima fazendo a delícia de quem aplaude e aprecia.
Composta e recomposta olha em volta, suspira, esboça um derradeiro sorriso, e conforme entrou em palco, lentamente se afasta, diluindo-se no horizonte do sol poente como uma estrela de cinema em fim de cena.

domingo, 15 de setembro de 2013

Estranho Amor

Título: Love
Fotógrafo: Olena Chernenko
Colecção: Vetta

Sempre que vertes uma lágrima,
o teu sangue corre-me as entranhas,
a dor queima-me as veias
e deixa-me o corpo em chamas.
Entre nós o amor é assim, estranho.
Vai para lá além do entendimento e da razão,
confunde-nos, fere-nos,
e testa-nos ao ponto de atingirmos o pico da exaustão.


domingo, 8 de setembro de 2013

Solidão, Maria Boneca?

Título: Young woman hiding face behind bunch of balloons in newspapers covered room, studio shot
Fotógrafo: Rubberball / Nicole Hill
Colecção: Royalty – free

Olha em seu redor,
observa com atenção
a movimentação das multidões,
as tendências da moda,
e outra coisas mais,
que nada interessam à vida alheia.
E ouve os desabafos das amigas,
dos amigos e da família.
Precisam de falar, de gritar,
de ouvir palavras de alento e de consolo,
sem terem o dedo da condenação
apontado na sua direcção.
(Ás vezes até parece
um confessionário beato
no acto da contrição, credo!!!)
Ela ouve, sorri,
faz um gesto de carinho mas pouco ou nada diz.
Perdeu a capacidade de falar,
então de si, nem vale a pena tentar.
Qualquer palavra mal atirada
ou outra mal interpretada pode sair-lhe cara.
Sente-se protegida,
escondida atrás da carapaça rija,
ninguém entra,
e ela não sai ferida.
Há que defender o pouco de bom que ainda lhe resta,
pois o resto, há muito,
que Maria Boneca há morto dentro de si.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Segredos

Título: Secrets
Fotógrafo: Olena Chernenko
Colecção: Vetta

Não me perguntes,
não te sei responder,
mas só tu me fazes falar
pelos cotovelos,
sem tabus e sem segredos...


domingo, 1 de setembro de 2013

Invasão de Propriedade

Título: Naked Young Woman Lying on Bed (B&W, grainy)
Fotógrafo: Rob Goldman
Colecção: Taxi

Sabias à partida
que a batida do lado de fora
não me faria abrir-te a porta.
Mas como a tua teimosia
é equivalente à minha,
montado nas asas do vento,
fintaste as adversidades do tempo,
entraste pela fresta da janela,
e trancaste-nos aos dois por dentro.
Escondeste-te de mim
atrás de tudo quanto havia,
foi da mesa ao sofá e da cama à rouparia,
até perecia que estávamos os dois em plena guerra fria.
Mas a tua vontade só um objecto movia,
a hora de colher o recolher do meu dia-a-dia.
Esperavas-me todas as noites escondido
no leito do meu desassossego,
e velavas-me o sono profundo,
e afagavas-me o cabelo em mil e um beijo
ao ponto de despertares o meu corpo inteiro
em resposta ao teu desejo.
E devagar, devagarinho, como quem nada quer,
entraste de mansinho no meu querer de te ser mulher.
E agora? Que moldaste o teu feitio ao meu terreno bravio,
continuas preparado para dar conta do desafio?